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LUZ, CÂMERA E...


Você é linda. Linda demais – Bia pensou ainda mais uma vez enquanto ouvia o interminável monólogo de culpas e desculpas discorrido por Estela.
Linda demais para ser tão cega – completou.
- Então... – prosseguiu Estela – ... Ele veio e disse que queria muito ficar comigo. Vibrei Bia. Vibrei muito. Mal acredito que aquele “lerdo” tomou ou demonstrou alguma iniciativa. Porra, depois de todo este tempo.
- Eu também não – respondeu Bia, tentando disfarçar o desânimo. Apenas tentando disfarçar o seu desânimo. Apesar de não...
- Não é maravilhoso? – perguntou Estela, quase feito uma adolescente. Uma adorável e apaixonada adolescente apesar dos seus trinta e poucos anos.
- Sem dúvida. Sem dúvida alguma. Uma maravilha – murmurou sem força - É uma maravilha que ele deixou a “lerdeza” de lado e demonstrou interesse por você. Finalmente. Finalmente demonstrou interesse além do seu próprio pau. Espero por isso há anos – respondeu Bia, quase sem disfarçar o seu constrangimento.
- Ele é absolutamente sensacional. Adoro – disse Estela.
- Sei. É mesmo. De uma rapidez impressionante. De uma ausência de arrogância notável – respondeu Bia, sem graça, sem apetite, sem vontade, sem o menor saco.
Estela, enfim percebeu o tom das palavras ditas por Bia e a encarou com um misto de surpresa e reprovação. Não entendeu de imediato o que estava acontecendo. Ficou confusa – O que é que há Bia? O que é que há? Qual o problema? – perguntou ríspida.
Bia respondeu com um olhar constrangido. Surpreso pela perspicácia de Estela. Apenas respondeu seca – O quê? Não entendi Estela. O que disse? – retrucou.
- Porra, o que é que há? O seu tom de voz, o seu desdém, a sua má vontade. Este tom de ironia. Qual o problema? Estou te contando algo muito importante que estou sentindo e você parece que está pouco se lixando. Não estou entendendo. De verdade não estou entendendo nada. Não parece você. Mesmo – afirmou.
Sou eu mesmo. Sou exatamente assim. Dissimulada – pensou Bia antes de responder mentindo – Nada. Nada fiz Estela. Pára de paranóia. Por favor. Está ficando louca. Completamente.
- Tem certeza? – Estela perguntou novamente com o ceticismo pulando à sua voz e com ainda mais raiva.
- Tá tudo bem – respondeu Bia, sem firmeza alguma – Tudo bem. Estou cansada apenas. Apenas cansada.
- Ok – respondeu Estela – Vai sair hoje? – prosseguiu.
Bia balançou a cabeça e respondeu – Não. Vou ficar em casa e arrumar umas coisas. Uns discos velhos, uns HDs antigos, umas drogas antigas, enfim, limpar a bagunça. Está tudo muito desorganizado – inclusive os pensamentos – pensou em silêncio.
Estela assentiu com a cabeça e disse – Ok. Bem, eu vou sair com ele. Espero que seja legal. Fique bem tá? Acho que está na hora de você ir. Preciso me arrumar e tals – afirmou.
- Com certeza. Preciso ir mesmo – Bia disse.
- Bem, nos falamos depois né? – perguntou Estela.
- Claro, com certeza.
E despediram-se...
Definitivamente.
Ao deixar o prédio debaixo da garoa fria da grande cidade naquele Sábado á noite, Bia acendeu o seu Marlboro Light e pensou como a vida muda rápido demais e todos mudam rápido demais e como o silêncio lento demais sobre os sentimentos conseguem mudar uma vida. Simplesmente mudar completamente uma vida. A sua própria vida.
E depois, alguém vai falar que é destino...
Claro que não.
Claro que não.
É apenas medo. Apenas medo...




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NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios.
APENAS RELÂMPAGOS... O beijo que você me deu sob o sol A chuva molhando os campos de maçã (Sob o Sol - Vibrosensores) Lembro que choveu MUITO naquela tarde. Muito mesmo. Mais do seria normal em qualquer outro dia, em qualquer outro dia que não aquele. Maldito. Tudo estava bem, mas o céu, como puro capricho, decidiu se rebelar. O céu, assim de repente, tornou-se cinza. Absurdamente cinza. Cinza chumbo, quase noite. E choveu muito mesmo naquela tarde. Como jamais eu pensei que poderia chover em qualquer outro dia normal. Em qualquer outro dia que não aquele. Maldito. Lembro-me que eu estava no parque central, quieto, pensando nas verdades que eu havia ouvido e arquitetando uma fuga mirabolante do viciado e repetitivo labirinto caótico que a minha vida havia se transformado. Lembro-me que não estava sol, nem tampouco abafado, e que, portanto, não havia tantas nuvens no céu capazes de provocar aquela tempestade. Não mesmo. Mas, ainda assim tudo aconteceu. Não me dei conta, e,