Pular para o conteúdo principal
CARTÕES POSTAIS EM BRANCO

- Você nunca sabe? – ela perguntou, aflita.
Ele a olhou como se o melhor fosse não dar resposta. Nenhuma resposta. Ficou em silêncio.
- Não? Nunca sabe? Responde caralho. Nunca sabe porra nenhuma? É isto? Ou é apenas um garoto amedrontado e cheio de frescuras, cheio de medos, cheio de dedos, que não gosta de se arriscar? – ela disse firme, fazendo uma força tremenda para não gritar e chamar toda a atenção do Clube Varsóvia para eles.
- Eu não sei o que devo dizer – ele arriscou, sabendo que estava jogando fora os seus últimos argumentos e as suas últimas chances.
Ela sorriu com ironia, com desprezo, com raiva – Não posso acreditar, sabe? Não mesmo. Não sabe o que dizer? Neste momento?
Ele assentiu com a cabeça, enquanto virava o resto da cerveja quente que sobrou em seu copo.
- Que tal dizer a verdade? – ela sugeriu – Que tal dizer a verdade ao menos uma vez.
Ele a encarou, agora furioso, praticamente fora de controle - O que muda? – perguntou – O que muda na merda da sua vida qualquer resposta que eu possa te dar? Você vai deixar de viajar com ele? Você vai deixar os seus planos de ir estudar naquele fim de mundo que chamam de Europa? Você vai abandonar a porra da bolsa que conseguiu? Você vai dar um pulo de alegria? Você vai arriscar os seus planos, os seus sonhos, as suas vontades? – É isso? Por causa de um beijo? Por causa de uma noite?
Ela desviou os olhos dele, rápido. Não queria, de forma alguma, que ele notasse e percebesse como eles estavam ficando molhados. Tristes. Sem cor. Ela ficou quieta por alguns instantes. Ele também. Ficaram apenas ouvindo a música que gritava nos alto falantes do Varsóvia.

- Há quantos anos nos conhecemos? – ela perguntou, finalmente quebrando o silêncio dos dois.
Ele franziu a testa e respondeu, sem a menor dúvida – Nove anos.
- Caralho – ela exclamou – Uma vida, não?
- Uma vida – ele concordou – Longa e feliz, né? Vai me escrever postais? – disse após acender um cigarro.
Ela sorriu, carinhosa – Claro que sim. Rabiscar postais, mandar fotos e escrever cartas. Vou aproveitar os cafés parisienses querido, pode apostar.
- Eu sei que você vai deixá-los em branco. Eu apenas sei. Mas, aproveite para ser feliz menina. É isto o que mais quero de você, sabia? – ele finalizou, num tom bossa nova, num tom triste.
Ela corou e sorriu e apenas ergueu o seu copo como numa espécie de celebração de adeus.
- Aos nossos próximos e distantes nove anos – ela gritou.
- Aos nossos passados e tão nossos nove anos – ele concordou.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NUCA

Ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Definitivamente não. Sem contas, protestos, cobranças ou ligações indesejadas. Nada. Nada a perturbar. Existiam apenas os lábios de Fernanda em sua nuca. Lábios deliciosos e densos. Intensos. Sempre pintados de uva. Sempre lindos. E os arrepios. Muitos arrepios. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. Muito feliz. Não existiam mais as más notícias. Não. Defitivamente não. Havia um aroma de uva no ar. Um perfume. E palavras sussuradas na dose certa. Na dose certa. E ela entrava em transe. Transe total. O lábio de Fernanda em sua nuca a deixava completamente feliz. Muito feliz. E molhada. E o abraço que vinha depois era como um gatilho para uma boa noite. Toques. Reflexos. Seios.
APENAS RELÂMPAGOS... O beijo que você me deu sob o sol A chuva molhando os campos de maçã (Sob o Sol - Vibrosensores) Lembro que choveu MUITO naquela tarde. Muito mesmo. Mais do seria normal em qualquer outro dia, em qualquer outro dia que não aquele. Maldito. Tudo estava bem, mas o céu, como puro capricho, decidiu se rebelar. O céu, assim de repente, tornou-se cinza. Absurdamente cinza. Cinza chumbo, quase noite. E choveu muito mesmo naquela tarde. Como jamais eu pensei que poderia chover em qualquer outro dia normal. Em qualquer outro dia que não aquele. Maldito. Lembro-me que eu estava no parque central, quieto, pensando nas verdades que eu havia ouvido e arquitetando uma fuga mirabolante do viciado e repetitivo labirinto caótico que a minha vida havia se transformado. Lembro-me que não estava sol, nem tampouco abafado, e que, portanto, não havia tantas nuvens no céu capazes de provocar aquela tempestade. Não mesmo. Mas, ainda assim tudo aconteceu. Não me dei conta, e,